Parece ficção científica, mas acredite: é possível captar, com pequenos fios de arame inseridos no cérebro, os comandos que os neurônios enviam aos músculos de ratinhos de laboratório, e levá-los a um computador que movimenta uma alavanca sem que o animal precise, de fato, se mexer. Esta descoberta do grupo do neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, e que o Cérebro Nosso trouxe até você em 2000, em princípio tem tudo para ser aplicada em breve ao cérebro de seres humanos paralisados.
A bem da verdade, a possibilidade de aplicação ao cérebro humano esbarrava num pequeno detalhe crucial. No experimento, os animais tinham a coluna espinhal intacta, garantindo que as ordens do cérebro chegassem até o alvo - os músculos. O problema em potencial é que, quando não há mais como ter suas ordens executadas, o cérebro possivelmente sofreria uma reorganização, e talvez até deixasse de gerar as ordens. Em outras palavras: talvez o cérebro, quando o corpo fica paralisado, desaprendesse a comandar os músculos - o que tornaria inútil o mais sofisticado dos aparelhos de "leitura cerebral".
Mas um estudo americano, publicado em outubro de 2001, mostra que a natureza está a favor do homem. Acompanhando por ressonância magnética funcional a ativação no cérebro de cinco voluntários tetraplégicos há mais de um ano, pesquisadores do Hospital Geral de Massachusetts observaram que quando os voluntários tentavam, sem sucesso, fazer movimentos com as partes paralizadas do corpo, havia ativação nas zonas motoras apropriadas do cérebro. Há evidência de uma pequena reorganização, mas o "mapa" no cérebro dos músculos paralizados do corpo ainda está lá. E continua dando ordens.
Mas talvez com mais tempo a reorganização vá aumentando, e o cérebro vá esquecendo aos poucos como era dar ordens aos músculos. Portanto, já que um dos lemas do cérebro parece ser "usar para não perder", o resultado do estudo sugere um novo dever-de-casa para quem está paralisado: por mais que pareça absurdo, pode ser uma boa idéia continuar tentando mover os músculos paralizados, como uma espécie de "fisioterapia virtual". O cérebro ainda sabe como fazê-lo, e não custa nada ir treinando para manter em forma suas habilidades de comando. Assim, ele estará bem preparado para o dia em que chegarão os eletrodos que substituirão a medula, danificada, na tarefa de transmitir os comandos aos músculos. E olha que desta vez a ficção científica não deve tardar a se tornar realidade...